segunda-feira, 27 de junho de 2011

Como se Fabricar Anjos

[Nota do Editor: a Kallyandra (pseudônimo) é minha amiga, ajudante acadêmica e está em processo de conclusão da pós-graduação dela, que trata justamente sobre a Indústria Cultural. Ela me pediu esse espaço por saber que na Academia não existe liberdade total para expressar todas as suas idéias. Os artigos dela terão formato acadêmico e serão semanais, mas sem qualquer obrigação de prazo. Só entendam que esse é só o primeiro]

Por Kallyandra

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A evolução da tecnologia e do mercado consumidor começou-se a transformar a cultura em mercadoria, aos poucos deixa de ser construída pelas pessoas e passa a ser fabricada para ser consumível. “Esse é o quadro caracterizador da Indústria Cultural: revolução industrial, capitalismo liberal, economia de mercado, sociedade de consumo.” (Coelho, 1993, p.07)

O que está acontecendo é que a Indústria Cultural está transformando tudo em comércio, inclusive nossa vontade, estamos em um Admirável Mundo Novo, estão substituindo leitura por pequenas frases de 140 caracteres, estamos acomodados, sentados na frente do computador esperando por diversão, pela satisfação de nossos sentidos, não pensamos mais porque esperamos que outros o façam por nós.

Não quero um mundo de fantasia, onde não posso questionar a realidade que vivemos em que os mecanismos de dominação estão presentes até no ato de respirar, não vou aceitar vivermos em um mundo temos que seguir padrões impostos por uma elite para saciar as corporações e sistemas políticos para poucos lucrarem e muitos obedecerem.

A Indústria Cultural tem ares de grandes revelações e de agradável peça de arte. Atrai, conquista, adultera, emburrece, anestesia, destrói — mas, numa atmosfera psicológica de algo que faz bem, eleva. Como dizia Adolf Hitler; “nunca fomos tão bem informados!”; hoje ouvimos dizer “nunca fomos tão autônomos!”. A informação vazia e a arte vulgarizada são instrumentos da seminformação vencedora. Lá, era deixar de sentir; agora, é ter a ilusão de sentir. (Ramos, 2008, p.133)

Estamos sendo arrebanhados por uma mídia que dizem como devemos pensar, que filmes assistir e de preferência não ler, desde nos primeiro anos de vida somos arrebanhados em escolas que são responsáveis em adestrar-nos com o conteúdo inútil, matérias sistematizadas, não há espaço para o questionamento.

Os meios de comunicações celebram a mediocridade, a aparência é celebrada e a burrice comemorada, se cultua pessoas vazias que são apenas pedaços de carne, fruta ou outro coisa que pode comida e não serve para mais nada, homens estão deixando de serem homens e mulheres de serem mulheres e estão virando Anjos.

Sua violação do tabu representou, antes de tudo, uma rigorosa obediência às leis do mercado [...] quando aquilo que impressiona é considerado bom, porque se torna necessário para a sobrevivência, então o que é impressionável não pode ser ruim. Dessa forma, o bem e o mal se transformam em categorias estéticas; e o estético, se transforma no ontológico, na possibilidade de ser ou não ser. (Türke apud Zuin, 2008, p.60)

Os anjos são criaturas cuja a única função é servir a deus, não têm livre arbítrio, não têm liberdade, é uma raça de escravos felizes por serem assim. O mundo atual está fazendo isso conosco, estamos virando escravos e gostamos disso, pois vamos apenas aparentar ser algo e não ser de verdade, estamos vivendo na felicidade da ignorância.

As agressões são constantemente apresentadas e são consideradas boas, afinal tenho que vestir 38 de qualquer maneira, aparecer em BBB, ouvir a música que dizem que temos que ouvir, não podemos fugir do padrão. As imposições sociais nos agridem no âmbito pessoal e moral. Na permissividade da violência, na quebra do material e imaterial causado por terceiros.

Por causa disso reagimos tão agressivamente quanto à agressão que estamos sofrendo, a sociedade impulsiona o consumo de bens materiais e imateriais em exagero, justamente por não saber revidar é que esta reação torna-se agressiva com atos caóticos que atingem a sociedade como um todo.

Milhões e milhões de pessoas, aterrorizadas de tédio e apreciando um ócio que elas não podem preencher por si mesmas, estão suplicando por distração, implorando para ser livradas de sua própria e intolerável companhia, ansiando para que lhes sejam dados substitutos para o pensamento. (Huxley apud Almeida, 2008, p.142)

É neste instante em que as pessoas necessitam preencher o vazio que é ditado pela Indústria Cultural que trabalha com todas as suas armas para conquistar os consumidores e a mercadoria é o modo de vida, a felicidade e de ter todos os desejos realizados, mas não avisam “que conseguir o que se deseja e ser feliz são coisas totalmente diferentes” (Gaiman, 2006, p.44).

O mecanismo de reprodução da vida, de sua dominação e aniquilação, é imediatamente o mesmo, e em conformidade com ele a indústria, o estado e a propaganda se amalgamam. Aquele antigo exagero dos liberais cépticos, de que a guerra é um negócio, tornou-se realidade: o poder estatal renunciou a própria aparência de independência em relação aos interesses particulares do lucro, pondo-se agora não só de fato a serviço destes, o que sempre fez – mas também ideologicamente. (Adorno, 1993, p.45)

É o que é repassado pelos meios de comunicação em massa são “mulheres perfeitas” sem celulite, estrias, muitas vezes utilizam o corpo para aparecer, rebolam nas frentes das câmeras, os homens são jogadores de futebol, altos, bonitos, mas pela fala percebemos que apenas aparentam ser e nada mais do que isso, não falam sobre estudar ou sobre terem outras possibilidades de viver, vendem a aparência e nada mais do que isso.

A educação é jogada no lixo, ensinam que devemos trabalhar para trocar minha TV nova de 42 polegadas por outra de 50 polegadas, tudo parcelado no cartão de crédito, comprar um carro novo, achar o parceiro ideal, em uma “balada” de preferência e sempre vai ser a primeira vista, casar, ter minha casa parcelada em 30 anos pela caixa econômica, ter filhos, reclamar da falta de perspectiva e futilidade dos filhos, trair e ser traído pelo parceiro, se divorciar, casar de novo, afinal achar a alma gêmea é o objetivo final e morrer infeliz pela vida de aparência que teve.

Não somos educados a questionar e muito menos a sermos felizes, esquecem que nossa felicidade depende das decisões que tomamos, felicidade é diferente de satisfação, satisfação e temporária o que sentimos após comermos e nossa sociedade quer nos dar apenas issosatisfação.

Como já dissemos a satisfação desencantada não pode ultrapassar o plano da aparência e da forma e, assim imediata, só pode dar-se no âmbito reduzido dos órgãos dos sentidos. [...] anestesiados pela imagem e pelo som, somos capazes de comer pacotes inteiros de porcarias sem perceber. São estímulos e gestos ritualizados e fragmentados de satisfação instantânea. (Ramos, 2003, p.92).

As sociedades, sendo administradas pela Indústria Cultural, fabricam as comunidades, por isso as sociedades parecem semelhantes, não importa o lugar, todos os lugares parecem os mesmos; o comportamento perante a sociedade, as calças jeans, os paletós, as leis, e várias outras características que em vez de individualizar o homem acaba por torná-lo igual, obediente, calado e feliz por sua posição, assim como os anjos, sendo que quando nos revoltamos somos mandados ao inferno.

O que esse discurso enfadonho tem haver com o discurso do Anonymous?

Absolutamente tudo.

Porém minha função não é dá respostas, mas levantar questionamentos.

E a minha grande pergunta é:

“Você é um Anjo Fabricado?”

Referências

Adorno, Theodor W.; Minimas Moralis: Reflexões a Partir da Vida Danificada, Tradução: Luiz Eduardo Bicca, Editora Ática, São Paulo-SP, 1993. Série: Temas Volume 30; Estudos Filosóficos.

Almeida, Jorge;. Theodor Adorno Leitor Aldous Huxley: Tempo Livre in Durão, Fábio Akcelrud; Zuin, Antônio; Vaz, Alexandre Fernandez (org.); A Indústria Cultural Hoje,Editora Boitempo, 2008.

Coelho, Teixera; O que é Indústria Cultural, 35ª Edição, Editora Brasiliense, 1993 (Coleção Primeiros Passos Volume 08)

Gaiman, Neil; SANDMAN: Noites sem Fim; Traduzido por: Daniel Pellizzari, São Paulo-SP, Editora CONRAD do Brasil 2006

Ramos, Conrado; Indústria Cultural, Consumismo e a Dinâmica das Satisfações no Mundo Administrado in Durão, Fábio Akcelrud; Zuin, Antônio; Vaz, Alexandre Fernandez (org.); A Indústria Cultural Hoje, Editora Boitempo, 2008.

Zuin, Antônio; Morte em Vídeo: Necrocam e a Indústria Cultural Hoje in Durão, Fábio Akcelrud; Zuin, Antônio; Vaz, Alexandre Fernandez (org.); A Indústria Cultural Hoje,Editora Boitempo, 2008.


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Como se Fabricar Anjos

[Nota do Editor: a Kallyandra (pseudônimo) é minha amiga, ajudante acadêmica e está em processo de conclusão da pós-graduação dela, que trata justamente sobre a Indústria Cultural. Ela me pediu esse espaço por saber que na Academia não existe liberdade total para expressar todas as suas idéias. Os artigos dela terão formato acadêmico e serão semanais, mas sem qualquer obrigação de prazo. Só entendam que esse é só o primeiro]

Por Kallyandra

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A evolução da tecnologia e do mercado consumidor começou-se a transformar a cultura em mercadoria, aos poucos deixa de ser construída pelas pessoas e passa a ser fabricada para ser consumível. “Esse é o quadro caracterizador da Indústria Cultural: revolução industrial, capitalismo liberal, economia de mercado, sociedade de consumo.” (Coelho, 1993, p.07)

O que está acontecendo é que a Indústria Cultural está transformando tudo em comércio, inclusive nossa vontade, estamos em um Admirável Mundo Novo, estão substituindo leitura por pequenas frases de 140 caracteres, estamos acomodados, sentados na frente do computador esperando por diversão, pela satisfação de nossos sentidos, não pensamos mais porque esperamos que outros o façam por nós.

Não quero um mundo de fantasia, onde não posso questionar a realidade que vivemos em que os mecanismos de dominação estão presentes até no ato de respirar, não vou aceitar vivermos em um mundo temos que seguir padrões impostos por uma elite para saciar as corporações e sistemas políticos para poucos lucrarem e muitos obedecerem.

A Indústria Cultural tem ares de grandes revelações e de agradável peça de arte. Atrai, conquista, adultera, emburrece, anestesia, destrói — mas, numa atmosfera psicológica de algo que faz bem, eleva. Como dizia Adolf Hitler; “nunca fomos tão bem informados!”; hoje ouvimos dizer “nunca fomos tão autônomos!”. A informação vazia e a arte vulgarizada são instrumentos da seminformação vencedora. Lá, era deixar de sentir; agora, é ter a ilusão de sentir. (Ramos, 2008, p.133)

Estamos sendo arrebanhados por uma mídia que dizem como devemos pensar, que filmes assistir e de preferência não ler, desde nos primeiro anos de vida somos arrebanhados em escolas que são responsáveis em adestrar-nos com o conteúdo inútil, matérias sistematizadas, não há espaço para o questionamento.

Os meios de comunicações celebram a mediocridade, a aparência é celebrada e a burrice comemorada, se cultua pessoas vazias que são apenas pedaços de carne, fruta ou outro coisa que pode comida e não serve para mais nada, homens estão deixando de serem homens e mulheres de serem mulheres e estão virando Anjos.

Sua violação do tabu representou, antes de tudo, uma rigorosa obediência às leis do mercado [...] quando aquilo que impressiona é considerado bom, porque se torna necessário para a sobrevivência, então o que é impressionável não pode ser ruim. Dessa forma, o bem e o mal se transformam em categorias estéticas; e o estético, se transforma no ontológico, na possibilidade de ser ou não ser. (Türke apud Zuin, 2008, p.60)

Os anjos são criaturas cuja a única função é servir a deus, não têm livre arbítrio, não têm liberdade, é uma raça de escravos felizes por serem assim. O mundo atual está fazendo isso conosco, estamos virando escravos e gostamos disso, pois vamos apenas aparentar ser algo e não ser de verdade, estamos vivendo na felicidade da ignorância.

As agressões são constantemente apresentadas e são consideradas boas, afinal tenho que vestir 38 de qualquer maneira, aparecer em BBB, ouvir a música que dizem que temos que ouvir, não podemos fugir do padrão. As imposições sociais nos agridem no âmbito pessoal e moral. Na permissividade da violência, na quebra do material e imaterial causado por terceiros.

Por causa disso reagimos tão agressivamente quanto à agressão que estamos sofrendo, a sociedade impulsiona o consumo de bens materiais e imateriais em exagero, justamente por não saber revidar é que esta reação torna-se agressiva com atos caóticos que atingem a sociedade como um todo.

Milhões e milhões de pessoas, aterrorizadas de tédio e apreciando um ócio que elas não podem preencher por si mesmas, estão suplicando por distração, implorando para ser livradas de sua própria e intolerável companhia, ansiando para que lhes sejam dados substitutos para o pensamento. (Huxley apud Almeida, 2008, p.142)

É neste instante em que as pessoas necessitam preencher o vazio que é ditado pela Indústria Cultural que trabalha com todas as suas armas para conquistar os consumidores e a mercadoria é o modo de vida, a felicidade e de ter todos os desejos realizados, mas não avisam “que conseguir o que se deseja e ser feliz são coisas totalmente diferentes” (Gaiman, 2006, p.44).

O mecanismo de reprodução da vida, de sua dominação e aniquilação, é imediatamente o mesmo, e em conformidade com ele a indústria, o estado e a propaganda se amalgamam. Aquele antigo exagero dos liberais cépticos, de que a guerra é um negócio, tornou-se realidade: o poder estatal renunciou a própria aparência de independência em relação aos interesses particulares do lucro, pondo-se agora não só de fato a serviço destes, o que sempre fez – mas também ideologicamente. (Adorno, 1993, p.45)

É o que é repassado pelos meios de comunicação em massa são “mulheres perfeitas” sem celulite, estrias, muitas vezes utilizam o corpo para aparecer, rebolam nas frentes das câmeras, os homens são jogadores de futebol, altos, bonitos, mas pela fala percebemos que apenas aparentam ser e nada mais do que isso, não falam sobre estudar ou sobre terem outras possibilidades de viver, vendem a aparência e nada mais do que isso.

A educação é jogada no lixo, ensinam que devemos trabalhar para trocar minha TV nova de 42 polegadas por outra de 50 polegadas, tudo parcelado no cartão de crédito, comprar um carro novo, achar o parceiro ideal, em uma “balada” de preferência e sempre vai ser a primeira vista, casar, ter minha casa parcelada em 30 anos pela caixa econômica, ter filhos, reclamar da falta de perspectiva e futilidade dos filhos, trair e ser traído pelo parceiro, se divorciar, casar de novo, afinal achar a alma gêmea é o objetivo final e morrer infeliz pela vida de aparência que teve.

Não somos educados a questionar e muito menos a sermos felizes, esquecem que nossa felicidade depende das decisões que tomamos, felicidade é diferente de satisfação, satisfação e temporária o que sentimos após comermos e nossa sociedade quer nos dar apenas issosatisfação.

Como já dissemos a satisfação desencantada não pode ultrapassar o plano da aparência e da forma e, assim imediata, só pode dar-se no âmbito reduzido dos órgãos dos sentidos. [...] anestesiados pela imagem e pelo som, somos capazes de comer pacotes inteiros de porcarias sem perceber. São estímulos e gestos ritualizados e fragmentados de satisfação instantânea. (Ramos, 2003, p.92).

As sociedades, sendo administradas pela Indústria Cultural, fabricam as comunidades, por isso as sociedades parecem semelhantes, não importa o lugar, todos os lugares parecem os mesmos; o comportamento perante a sociedade, as calças jeans, os paletós, as leis, e várias outras características que em vez de individualizar o homem acaba por torná-lo igual, obediente, calado e feliz por sua posição, assim como os anjos, sendo que quando nos revoltamos somos mandados ao inferno.

O que esse discurso enfadonho tem haver com o discurso do Anonymous?

Absolutamente tudo.

Porém minha função não é dá respostas, mas levantar questionamentos.

E a minha grande pergunta é:

“Você é um Anjo Fabricado?”

Referências

Adorno, Theodor W.; Minimas Moralis: Reflexões a Partir da Vida Danificada, Tradução: Luiz Eduardo Bicca, Editora Ática, São Paulo-SP, 1993. Série: Temas Volume 30; Estudos Filosóficos.

Almeida, Jorge;. Theodor Adorno Leitor Aldous Huxley: Tempo Livre in Durão, Fábio Akcelrud; Zuin, Antônio; Vaz, Alexandre Fernandez (org.); A Indústria Cultural Hoje,Editora Boitempo, 2008.

Coelho, Teixera; O que é Indústria Cultural, 35ª Edição, Editora Brasiliense, 1993 (Coleção Primeiros Passos Volume 08)

Gaiman, Neil; SANDMAN: Noites sem Fim; Traduzido por: Daniel Pellizzari, São Paulo-SP, Editora CONRAD do Brasil 2006

Ramos, Conrado; Indústria Cultural, Consumismo e a Dinâmica das Satisfações no Mundo Administrado in Durão, Fábio Akcelrud; Zuin, Antônio; Vaz, Alexandre Fernandez (org.); A Indústria Cultural Hoje, Editora Boitempo, 2008.

Zuin, Antônio; Morte em Vídeo: Necrocam e a Indústria Cultural Hoje in Durão, Fábio Akcelrud; Zuin, Antônio; Vaz, Alexandre Fernandez (org.); A Indústria Cultural Hoje,Editora Boitempo, 2008.


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